Maria Alice Estrella

Convenção

Por Maria Alice Estrella

O amor é inexplicável. Acontece e pronto! Foi assim com ela, cisne de rara plumagem ao encontrar com ele, patinho feio. Ambos deslizavam no macio das águas, indiferentes aos olhares surpresos e críticos de todos.

Enamorados de ternuras descobertas, de sorrisos iluminados, de cumplicidades intocáveis, de gestos transcendentes e acalorados carinhos em meio a olhares únicos e transparentes.

Entre eles a afinidade superava as diferenças. Diferenças que escapavam de avaliações, ponderações ou outras ações quaisquer.

Amavam-se com a força da torrente da vida que, algumas vezes, aproxima almas parceiras e as ata com laços indeléveis de um aço invisível.

O diálogo era constante. A rapidez de raciocínio dos dois era o denominador comum que os possibilitava navegar sem leme, sem vento, sem bússola ao sabor dos pensamentos ágeis que os norteavam. Conheciam-se profundamente. Reconheciam-se privilegiados.

Navegaram juntos por algum tempo, alheios aos entraves que tentavam lhes cercear a liberdade de ser e de estar como lhes conviesse.

Muitos desaprovavam o afeto que nutriam mutuamente. Ponderavam que a beleza dela merecia um Adônis como par, que ele não fazia jus à postura de cisne dela. Não passava de um patinho feio, desajeitado.

A sobrevivência do afeto que nutriam em comum e de comum acordo fora fadada, no entanto, ao desfecho do “fez-se sozinho o que se fez amante, de repente, não mais que de repente”, parafraseando o poeta.

Nos desvios do destino seguiram por córregos diversos. A garantia do laço de aço invisível prescrevera.

Foi-se no deslizar das águas a expectativa de perenidade, de continuidade, de felicidade.

Afastados, mergulharam em novas realidades e trataram de adaptar a frustração, que sempre acompanha o final de um romance, ao vir à tona de vivências inéditas.

Atualmente, ela continua na busca de alguém que a compreenda na dimensão do outrora. Ele, lapidado pelo cotidiano, permanece com a aparência de um patinho feio procurando a amada em todos os espaços. Distantes um do outro, porém, levam o desenrolar das horas, aquietando a mente com interesses vários para disfarçar a incompletude que os assola.

Quem não tem uma história de amor inacabado? Inexplicável querer bem, que prescinde do racional e se alimenta do puro sentimento.

Quem nunca teve na vida, um cisne, um patinho feio?

Raramente se supõe que as artimanhas dos caminhos tramam a nosso favor. Pensamos que o inverso é a regra.

Afora a nossa vontade, vez ou outra o destino nos surpreende.

Foi assim com o cisne e o patinho feio.

Voltaram a se encontrar ao acaso e, para espanto dela, cisne de majestosa aparência, viu nele, não mais o patinho feio, mas um elegante e soberbo cisne a deslizar em sua direção como quem chega ao lugar de onde jamais deveria ter partido.

Se as almas são gêmeas, pouco importa o invólucro que as reveste.

O amor é inexplicável! Sentimento que nivela as diferenças, apara as arestas e revela o semblante da alma estampado em outra alma para além de toda e qualquer aparência, forma ou feitio.​

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